April 14, 2025
By Thiago Favero, EVCF Fellow
“O mercado cresceu rápido e, em alguns momentos, faltou disciplina — valuations inflados, termos fracos, expectativas desalinhadas com a realidade de liquidez. O ciclo precisa fechar com mais saídas relevantes para sustentar o crescimento.”
Pedro Mesquita é parte do time de investimentos da Mindset Ventures e criador da newsletter TechTalents Latam, onde compartilha os principais movimentos de talentos no ecossistema de tecnologia da América Latina. Conversamos sobre sua trajetória, o cenário de VC em diferentes geografias e como um side project pessoal acabou impactando diretamente sua atuação como investidor.
Pedro: Sempre fui muito ligado em tecnologia desde novo. É curioso perceber como muita gente de tech compartilha esse histórico — videogames, gadgets, jailbreaks. No meu caso, isso sempre andou em paralelo com um interesse por negócios. Estudei Administração na FGV e, no fim da faculdade, começei a estagiar na Mindset Ventures, em 2018. Não conhecia muito sobre venture capital na época, mas a tese do fundo fez bastante sentido desde o início: falar com fundadores de diferentes mercados, entender tecnologias inovadoras, construir visão sobre setores.
Na época, o time era bem enxuto, então acabei passando por várias frentes: reporting, prospecção, diligência, análise. Fui efetivado no ano seguinte e optei por seguir na área de investimentos — tudo relacionado ao pré-deal. Desde então, já analisei mais de 500 empresas, cadastrei mais de 12 mil no CRM e participei de mais de 40 investimentos, incluindo Brex, Turing.com, Payjoy e Fundguard. Também estruturei diversos processos internos e passei quase um ano nos Estados Unidos, dividindo o tempo entre São Francisco e Nova Iorque, representando a Mindset localmente.
Pedro: A Mindset investe exclusivamente em startups com base nos EUA e Israel, sempre com foco em B2B Software. A tese é captar de brasileiros e ajudar essas empresas a expandirem para a América Latina. Coinvestimos com fundos locais, sem liderar rodada, com cheques médios de US$ 1,5 milhão.
Os perfis de fundadores variam bastante. Nos EUA, a capacidade de storytelling é altíssima — o pitch já vem formatado com a lógica que o VC quer ouvir. Em Israel, os fundadores são muito mais voltados à execução. Têm foco em dados e produto, e costumam ser bem diretos. No Brasil, vejo um perfil mais conservador, especialmente em relação à gestão de caixa. Isso tem seus méritos, mas às vezes limita o ritmo de crescimento.
Em tecnologia, Israel é referência em cibersegurança. Nos EUA, o foco atual está em infraestrutura de AI. No Brasil, vemos mais aplicações de AI — soluções práticas para setores específicos, mas com menor profundidade técnica. E em termos de mercado, o nível de especialização e competição que existe nos EUA ainda está distante do que temos por aqui.
Pedro: O primeiro ponto é cultural. Empreender no Brasil ainda carrega um peso alto — especialmente para perfis técnicos, que muitas vezes optam por caminhos mais seguros em big techs, com estabilidade e bons salários. Lá fora, principalmente nos EUA e em Israel, falhar faz parte da trajetória. Aqui, ainda existe muito estigma.
Tem também uma barreira financeira real. Nem todo mundo pode bancar seis meses ou mais desenvolvendo produto sem receita. E como o acesso a capital early stage ainda é limitado, mesmo fundadores preparados têm dificuldade de entrar no jogo se não têm rede ou runway pessoal.
Outro ponto é a desconexão entre perfis técnicos e de negócios. Vejo muita gente com background de gestão buscando CTOs, e desenvolvedores querendo empreender, mas sem pontes claras entre esses dois mundos. Isso dificulta a formação de times complementares no começo da jornada.
Do lado dos fundos, a evolução recente foi positiva, mas com algumas distorções. O mercado cresceu rápido e, em alguns momentos, faltou disciplina — valuations inflados, termos fracos, expectativas desalinhadas com a realidade de liquidez. O ciclo precisa fechar com mais saídas relevantes para sustentar o crescimento.
E, por fim, o suporte pós-investimento. Ainda são poucos os fundos que acompanham de forma ativa e estratégica. À medida que os investidores se posicionarem como parceiros de verdade, isso naturalmente acelera a maturidade do ecossistema como um todo.
Pedro: O ponto de partida veio de ferramentas que eu já vinha desenvolvendo dentro da Mindset para captação e priorização de startups. A partir de dados públicos — como headcount, mudanças no LinkedIn, vagas abertas — criei sistemas para apoiar nossas decisões de investimento.
Ao mesmo tempo, senti falta de ter mais presença no ecossistema da América Latina. Como o fundo investe só fora, minha atuação acabava restrita aos mercados de Israel e EUA. Quando conheci uma newsletter americana que mapeava founders em stealth, percebi que poderia adaptar a ideia para o contexto Latam.
A TechTalents nasceu dessa junção: ferramentas internas + desejo de participar mais ativamente do ecossistema local. Hoje, ela já passou de 20 edições e continua evoluindo.
Pedro: Hoje o projeto tem três frentes principais:
Newsletter quinzenal, que compartilha movimentos de talentos em tempo real.
TechTalents Base, uma base de dados estruturada com os nomes e informações mapeadas, voltada a fundos parceiros.
TechTalents Match, uma plataforma para founders e profissionais fazerem networking qualificado ou encontrarem cofounders.
O impacto na minha atuação como investidor tem sido direto. Por um lado, aumentou minha exposição e ampliou minha rede. Por outro, me trouxe uma vivência mais operacional: criar produto, falar com usuário, iterar conteúdo. São aprendizados que me aproximam da realidade dos founders e me ajudam a ser um VC mais completo.
Pedro: Tenho me dedicado bastante à corrida nos últimos tempos — fui picado pelo “bichinho” recentemente. Também faço academia, jogo tênis e gosto de acompanhar o mundo do cinema. Sempre que dá, tento viajar, dentro ou fora do Brasil.
Pedro: VC é um jogo de longo prazo. Os fundos são desenhados para ciclos de 10 anos, e a sua própria trajetória também vai seguir esse tempo. Por isso, é importante construir processos sólidos, reputação consistente e boas relações. Entender no que você é bom, melhorar o que não é, e sempre estar disposto a ajudar sem esperar retorno imediato. No fim das contas, esse é um mercado baseado em confiança.